quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

O Livro dos Espíritos: introdução XV

Há também pessoas que vêem perigo por toda parte e em tudo o que não conhecem.
Daí a pressa com que, do fato de haverem perdido a razão alguns dos que se entregaram a estes estudos, tiram conclusões desfavoráveis ao Espiritismo. Como é que homens
sensatos enxergam nisto uma objeção valiosa? Não se dá o mesmo com todas as
preocupações de ordem intelectual que empolguem um cérebro fraco? Quem será capaz de
precisar quantos loucos e maníacos os estudos da matemática, da medicina, da música, da
filosofia e outros têm produzido? Dever-se-ia, em conseqüência, banir esses estudos? Que
prova isso? Nos trabalhos corporais, estropiam-se os braços e as pernas, que são os
instrumentos da ação material; nos trabalhos da inteligência, estropia-se o cérebro, que é o
do pensamento. Mas, por se haver quebrado o instrumento, não se segue que o mesmo
tenha acontecido ao Espírito. Este permanece intacto e, desde que se liberte da matéria,
gozará, tanto quanto qualquer outro, da plenitude das suas faculdades. No seu gênero, ele é,
como homem, um mártir do trabalho.
Todas as grandes preocupações do espírito podem ocasionar a loucura: as ciências,
as artes e até a religião lhe fornecem contingentes. A loucura tem como causa primária uma
predisposição orgânica do cérebro, que o torna mais ou menos acessível a certas
impressões. Dada a predisposição para a loucura, esta tomará o caráter de preocupação
principal, que então se muda em idéia fixa, podendo tanto ser a dos Espíritos, em quem com
eles se ocupou, como a de Deus, dos anjos, do diabo, da fortuna, do poder, de uma arte, de
uma ciência, da maternidade, de um sistema político ou social. Provavelmente, o louco
religioso se houvera tornado um louco espírita, se o Espiritismo fora a sua preocupação
dominante, do mesmo modo que o louco espírita o seria sob outra forma, de acordo com as 
circunstâncias.
Digo, pois, que o Espiritismo não tem privilégio algum a esse respeito. Vou mais
longe: digo que, bem compreendido, ele é um preservativo contra a loucura.
Entre as causas mais comuns de sobreexcitação cerebral, devem contar-se as
decepções, os infortúnios, as afeições contrariadas, que, ao mesmo tempo, são as causas
mais freqüentes de suicídio. Ora, o verdadeiro espírita vê as coisas deste mundo de um
ponto de vista tão elevado; elas lhe parecem tão pequenas, tão mesquinhas, a par do futuro
que o aguarda; a vida se lhe mostra tão curta, tão fugaz, que, aos seus olhos, as tribulações
não passam de incidentes desagradáveis, no curso de uma viagem. O que, em outro,
produziria violenta emoção, mediocremente o afeta. Demais, ele sabe que as amarguras da
vida são provas úteis ao seu adiantamento, se as sofrer sem murmurar, porque será recompensado na medida da coragem com que as houver suportado. Suas convicções lhe dão,
assim, uma resignação que o preserva do desespero e, por conseguinte, de uma causa
permanente de loucura e suicídio. Conhece também, pelo espetáculo que as comunicações
com os Espíritos lhe proporcionam, qual a sorte dos que voluntariamente abreviam seus
dias e esse quadro é bem de molde a fazê-lo refletir, tanto que a cifra muito considerável já
ascende o número dos que foram detidos em meio desse declive funesto. Este é um dos
resultados do Espiritismo. Riam quanto queiram os incrédulos. Desejo-lhes as consolações
que ele prodigaliza a todos os que se hão dado ao trabalho de lhe sondar as misteriosas
profundezas.
Cumpre também colocar entre as causas da loucura o pavor, sendo que o do diabo já
desequilibrou mais de um cérebro. Quantas vítimas não têm feito os que abalam
imaginações fracas com esse quadro, que cada vez mais pavoroso se esforçam por tornar,
mediante horríveis pormenores? O diabo, dizem, só mete medo a crianças, é um freio para
fazê-las ajuizadas. Sim, é, do mesmo modo que o papão e o lobisomem. Quando, porém,
elas deixam de ter medo, estão piores do que dantes. E, para alcançar-se tão belo resultado,
não se levam em conta as inúmeras epilepsias causadas pelo abalo de cérebros delicados.
Bem frágil seria a religião se, por não infundir terror, sua força pudesse ficar comprometida.
Felizmente, assim não é. De outros meios dispõe ela para atuar sobre as almas. Mais
eficazes e mais sérios são os que o Espiritismo lhe faculta, desde que ela os saiba utilizar.
Ele mostra a realidade da coisas e só com isso neutraliza os funestos efeitos de um temor
exagerado.

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