quinta-feira, 7 de março de 2013

O Livro dos Espíritos: perguntas 51 a 60


51. Poderemos saber em que época viveu Adão?
“Mais ou menos na que lhe assinais : cerca de 4.000 anos antes do Cristo.”

O homem, cuja tradição se conservou sob o nome de Adão, foi dos que
sobreviveram, em certa região, a alguns dos grandes cataclismos que revolveram em
diversas épocas a superfície do globo, e se constituiu tronco de uma das raças que atualmente o povoam. As leis da Natureza se opõem a que os progressos da Humanidade, comprovados muito tempo antes do Cristo, se tenham realizado em alguns séculos, como houvera sucedido se o
homem não existisse na Terra senão a partir da época indicada para a existência de Adão.
Muitos, com mais razão, consideram Adão um mito ou uma alegoria que personifica as
primeiras idades do mundo.

Diversidade das raças humanas

52. Donde provêm as diferenças físicas e morais que distinguem as raças humanas
na Terra?
“Do clima, da vida e dos costumes. Dá-se aí o que se dá com dois filhos de uma
mesma mãe que, educados longe um do outro e de modos diferentes, em nada se
assemelharão, quanto ao moral.”

53. O homem surgiu em muitos pontos do globo?

“Sim e em épocas várias, o que também constitui uma das causas da diversidade das
raças. Depois, dispersando-se os homens por climas diversos e aliando-se os de uma aos de
outras raças, novos tipos se formaram.”

a) - Estas diferenças constituem espécies distintas?
“Certamente que não; todos são da mesma família. Porventura as múltiplas
variedades de um mesmo fruto são motivo para que elas deixem de formar uma só
espécie?”

54. Pelo fato de não proceder de um só indivíduo a espécie humana, devem os
homens deixar de considerar-se irmãos?
“Todos os homens são irmãos em Deus, porque são animados pelo espírito e tendem
para o mesmo fim. Estais sempre inclinados a tomar as palavras na sua significação literal.”


Pluralidade dos mundos


55. São habitados todos os globos que se movem no espaço?
“Sim e o homem terreno está longe de ser, como supõe, o primeiro em inteligência,
em bondade e em perfeição. Entretanto, há homens que se têm por espíritos muito fortes e
que imaginam pertencer a este pequenino globo o privilégio de conter seres racionais.
Orgulho e vaidade! Julgam que só para eles criou Deus o Universo.”

Deus povoou de seres vivos os mundos, concorrendo todos esses seres para o
objetivo final da Providência. Acreditar que só os haja no planeta que habitamos fora
duvidar da sabedoria de Deus, que não fez coisa alguma inútil. Certo, a esses mundos há de
ele ter dado uma destinação mais séria do que a de nos recrearem a vista. Aliás, nada há,
nem na posição, nem no volume, nem na constituição física da Terra, que possa induzir à
suposição de que ela goze do privilégio de ser habitada, com exclusão de tantos milhares de
milhões de mundos semelhantes.


56. É a mesma a constituição física dos diferentes globos?
“Não; de modo algum se assemelham.”

57. Não sendo uma só para todos a constituição física dos mundos, seguir-se-á
tenham organizações diferentes os seres que os habitam?
“Sem dúvida, do mesmo modo que no vosso os peixes são feitos para viver na água
e os pássaros no ar.”

58. Os mundos mais afastados do Sol estarão privados de luz e calor, por motivo de
esse astro se lhes mostrar apenas com a aparência de uma estrela?
“Pensais então que não há outras fontes de luz e calor além do Sol e em nenhuma
conta tendes a eletricidade que, em certos mundos, desempenha um papel que desconheceis
e bem mais importante do que o que lhe cabe desempenhar na Terra? Demais, não dissemos que todos os seres são feitos de igual matéria que vós outros e com órgãos de conformação idêntica à dos vossos.”

As condições de existência dos seres que habitam os diferentes mundos hão de ser
adequadas ao meio em que lhes cumpre viver. Se jamais houvéramos visto peixes, não
compreenderíamos pudesse haver seres que vivessem dentro dágua. Assim acontece com
relação aos outros mundos, que sem dúvida contêm elementos que desconhecemos. Não
vemos na Terra as longas noites polares iluminadas pela eletricidade das auroras boreais?
Que há de impossível em ser a eletricidade, nalguns mundos, mais abundante do que na
Terra e desempenhar neles uma função de ordem geral, cujos efeitos não podemos
compreender? Bem pode suceder, portanto, que esses mundos tragam em si mesmos as
fontes de calor e de luz necessárias a seus habitantes.


Considerações e concordâncias bíblicas concernentes à Criação


59. Os povos hão formado idéias muito divergentes acerca da Criação, de acordo
com as luzes que possuíam. Apoiada na Ciência, a razão reconheceu a inverossimilhança de
algumas dessas teorias. A que os Espíritos apresentam confirma a opinião de há muito
partilhada pelos homens mais esclarecidos.
A objeção que se lhe pode fazer é a de estar em contradição com o texto dos livros
sagrados. Mas, um exame sério mostrará que essa contradição é mais aparente do que real e
que decorre da interpretação dada ao que muitas vezes só tinha sentido alegórico.
A questão de ter sido Adão, como primeiro homem, a origem exclusiva da
Humanidade, não é a única a cujo respeito as crenças religiosas tiveram que se modificar. O
movimento da Terra pareceu, em determinada época, tão em oposição às letras sagradas,
que não houve gênero de perseguições a que essa teoria não tivesse servido de pretexto, e,
no entanto, a Terra gira, mau grado aos anátemas, não podendo ninguém hoje contestá-lo,
sem agravo à sua própria razão.
Diz também a Bíblia que o mundo foi criado em seis dias e põe a época da sua
criação há quatro mil anos, mais ou menos, antes da era cristã. Anteriormente, a Terra não existia; foi tirada do nada: o texto
é formal. Eis, porém, que a ciência positiva, a inexorável ciência, prova o contrário. A
história da formação do globo terráqueo está escrita em caracteres irrecusáveis no mundo
fóssil, achando-se provado que os seis dias da criação indicam outros tantos períodos, cada
um de, talvez, muitas centenas de milhares de anos. Isto não é um sistema, uma doutrina,
uma opinião insulada; é um fato tão certo como o do movimento da Terra e que a Teologia
não pode negar-se a admitir, o que demonstra evidentemente o erro em que se está sujeito a
cair tomando ao pé da letra expressões de uma linguagem freqüentemente figurada. Deverse-
á daí concluir que a Bíblia é um erro? Não; a conclusão a tirar-se é que os homens se
equivocaram ao interpretá-la.
Escavando os arquivos da Terra, a Ciência descobriu em que ordem os seres vivos
lhe apareceram na superfície, ordem que está de acordo com o que diz a Gênese, havendo
apenas a notar-se a diferença de que essa obra, em vez de executada milagrosamente por
Deus em algumas horas, se realizou, sempre pela Sua vontade, mas conformemente à lei
das forças da Natureza, em alguns milhões de anos. Ficou sendo Deus, por isso, menor e
menos poderoso? Perdeu em sublimidade a Sua obra, por não ter o prestígio da
instantaneidade? Indubitavelmente, não. Fora mister fazer-se da Divindade bem mesquinha
idéia, para se não reconhecer a sua onipotência nas leis eternas que ela estabeleceu para
regerem os mundos. A ciência, longe de apoucar a obra divina, no-la mostra sob aspecto
mais grandioso e mais acorde com as noções que temos do poder e da majestade de Deus,
pela razão mesma de ela se haver efetuado sem derrogação das leis da Natureza.

De acordo, neste ponto, com Moisés, a Ciência coloca o homem em último lugar na
ordem da criação dos seres vivos. Moisés, porém, indica, como sendo o do dilúvio
universal, o ano 1654 da formação do mundo, ao passo que a Geologia nos aponta o grande
cataclismo como anterior ao aparecimento do homem, atendendo a que, até hoje, não se
encontrou, nas camadas primitivas, traço algum de sua presença, nem da dos animais de
igual categoria, do ponto de vista físico. Contudo, nada prova que isso seja impossível.
Muitas descobertas já fizeram surgir dúvidas a tal respeito. Pode dar-se que, de um
momento para outro, se adquira a certeza material da anterioridade da raça humana e então
se reconhecerá que, a esse propósito, como a tantos outros, o texto bíblico encerra uma figura. A questão está em saber se o cataclismo
geológico é o mesmo a que assistiu Noé. Ora, o tempo necessário à formação das camadas
fósseis não permite confundi-los e, desde que se achem vestígios da existência do homem
antes da grande catástrofe, provado ficará, ou que Adão não foi o primeiro homem, ou que a
sua criação se perde na noite dos tempos. Contra a evidência não há raciocínios possíveis;
forçoso será aceitar-se esse fato, como se aceitaram o do movimento da Terra e os seis
períodos da Criação.
A existência do homem antes do dilúvio geológico ainda é, com efeito, hipotética.
Eis aqui, porém, alguma coisa que o é menos. Admitindo-se que o homem tenha aparecido
pela primeira vez na Terra 4.000 anos antes do Cristo e que, 1650 anos mais tarde, toda a
raça humana foi destruída, com exceção de uma só família, resulta que o povoamento da
Terra data apenas de Noé, ou seja: de 2.350 anos antes da nossa era. Ora, quando os hebreus
emigraram para o Egito, no décimo oitavo século, encontraram esse país muito povoado e
já bastante adiantado em civilização. A História prova que, nessa época, as Índias e outros
países também estavam florescentes, sem mesmo se ter em conta a cronologia de certos
povos, que remonta a uma época muito mais afastada. Teria sido preciso, nesse caso, que
do vigésimo quarto ao décimo oitavo século, isto é, que num espaço de 600 anos, não
somente a posteridade de um único homem houvesse podido povoar todos os imensos
países então conhecidos, suposto que os outros não o fossem, mas também que, nesse curto
lapso de tempo, a espécie humana houvesse podido elevar-se da ignorância absoluta do
estado primitivo ao mais alto grau de desenvolvimento intelectual, o que é contrário a todas
as leis antropológicas. A diversidade das raças corrobora, igualmente, esta opinião, O clima e os costumes
produzem, é certo, modificações no caráter físico; sabe-se, porém, até onde pode ir a
influência dessas causas. Entretanto, o exame fisiológico demonstra haver, entre certas
raças, diferenças constitucionais mais profundas do que as que o clima é capaz de
determinar. O cruzamento das raças dá origem aos tipos intermediários. Ele tende a apagar
os caracteres extremos, mas não os cria; apenas produz variedades. Ora, para que tenha
havido cruzamento de raças, preciso era que houvesse raças distintas. Como, porém, se
explicará a existência delas, atribuindo-se-lhes uma origem comum e, sobretudo, tão pouco
afastada? Como se há de admitir que, em poucos séculos, alguns descendentes de Noé se tenham transformado ao ponto de produzirem a raça etíope, por
exemplo? Tão pouco admissível é semelhante metamorfose, quanto a hipótese de uma
origem comum para o lobo e o cordeiro, para o elefante e o pulgão, para o pássaro e o
peixe. Ainda uma vez: nada pode prevalecer contra a evidência dos fatos.
Tudo, ao invés, se explica, admitindo-se: que a existência do homem é anterior à
época em que vulgarmente se pretende que ela começou; que diversas são as origens; que
Adão, vivendo há seis mil anos, tenha povoado uma região ainda desabitada; que o dilúvio
de Noé foi uma catástrofe parcial, confundida com o cataclismo geológico; e atentando-se,
finalmente, na forma alegórica peculiar ao estilo oriental, forma que se nos depara nos
livros sagrados de todos os povos. Isto faz ver quanto é prudente não lançar levianamente a
pecha de falsas a doutrinas que podem, cedo ou tarde, como tantas outras, desmentir os que
as combatem. As idéias religiosas, longe de perderem alguma coisa, se engrandecem,
caminhando de par com a Ciência. Esse o meio único de não apresentarem lado vulnerável
ao cepticismo.






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