sábado, 9 de fevereiro de 2013

Livro dos Espíritos: introdução XVII

O cepticismo, no tocante à Doutrina Espírita, quando não resulta de uma oposição
sistemática por interesse, origina-se quase sempre do conhecimento incompleto dos fatos, o
que não obsta a que alguns cortem a questão como se a conhecessem a fundo. Pode-se ter
muito atilamento, muita instrução mesmo, e carecer-se de bom-senso. Ora, o primeiro
indício da falta de bom-senso está em crer alguém infalível o seu juízo. Muita gente
também para quem as manifestações espíritas nada mais são do que objeto de curiosidade.
Confiamos em que, lendo este livro, encontrarão nesses extraordinários fenômenos alguma
coisa mais do que simples passatempo.
A ciência espírita compreende duas partes: experimental uma, relativa às
manifestações em geral, filosófica, outra, relativa às manifestações inteligentes. Aquele que
apenas haja observado a primeira se acha na posição de quem não conhecesse a Física
senão por experiências recreativas, sem haver penetrado no âmago da ciência. A verdadeira
Doutrina Espírita está no ensino que os Espíritos deram, e os conhecimentos que esse
ensino comporta são por demais profundos e extensos para serem adquiridos de qualquer
modo, que não por um estudo perseverante, feito no silêncio e no recolhimento. Porque, só
dentro desta condição se pode observar um número infinito de fatos e particularidades que
passam despercebidos ao observador superficial, e firmar opinião. Não produzisse este livro
outro resultado além do de mostrar o lado sério da questão e de provocar estudos neste
sentido e rejubilaríamos por haver sido eleito para executar uma obra em que, aliás, nenhum
mérito pessoal pretendemos ter, pois que os princípios nela exarados não são de criação
nossa. O mérito que apresenta cabe todo aos Espíritos que a ditaram. Esperamos que dará
outro resultado, o de guiar os homens que desejem esclarecer-se, mostrando-lhes, nestes estudos, um fim grande e sublime: o do progresso individual e social e o de lhes indicar o
caminho que conduz a esse fim.
Concluamos, fazendo uma última consideração. Alguns astrônomos, sondando o
espaço, encontraram, na distribuição dos corpos celestes, lacunas não justificadas e em
desacordo com as leis do conjunto. Suspeitaram que essas lacunas deviam estar preenchidas
por globos que lhes tinham escapado à observação. De outro lado, observaram certos
efeitos, cuja causa lhes era desconhecida e disseram: Deve haver ali um mundo, porquanto
esta lacuna não pode existir e estes efeitos hão de ter uma causa. Julgando então da causa
pelo efeito, conseguiram calcular-lhe os elementos e mais tarde os fatos lhes vieram
confirmar as previsões. Apliquemos este raciocínio a outra ordem de idéias. Se se observa a
série dos seres, descobre-se que eles formam uma cadeia sem solução de continuidade,
desde a matéria bruta até o homem mais inteligente. Porém, entre o homem e Deus, alfa e
ômega de todas as coisas, que imensa lacuna! Será racional pensar-se que no homem
terminam os anéis dessa cadeia e que ele transponha sem transição a distância que o separa
do infinito? A razão nos diz que entre o homem e Deus outros elos necessariamente haverá,
como disse aos astrônomos que, entre os mundos conhecidos, outros haveria,
desconhecidos. Que filosofia já preencheu esta lacuna? O Espiritismo no-la mostra
preenchida pelos seres de todas as ordens do mundo invisível e estes seres não são mais do
que os Espíritos dos homens, nos diferentes graus que levam à perfeição. Tudo então se
liga, tudo se encadeia, desde o alfa até o ômega. Vós, que negais a existência dos Espíritos,
preenchei o vácuo que eles ocupam. E vós, que rides deles, ousai rir das obras de Deus e da
Sua onipotência!
ALLAN KARDEC.

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